Quem acompanha a apuração do Carnaval de São Paulo observou uma constante neste ano: a quantidade de notas dez dadas pelos jurados.
Uma pesquisa básica e é possível encontrar este panorama: são atribuídas às escolas 504 notas (de quatro jurados, em nove quesitos, para 14 escolas). Em 2016, as notas dez representaram 42,6% do mapa geral (215). No ano seguinte, foram dadas 288 notas máximas, representando 57,1% do total.
Em 2018, um novo salto: foram impressionantes 74% de notas dez – 373, no total. A foto deste post é apenas uma ilustração, visual, já que a ala da X-9 Paulsitana remete à própria folia, e ao dia que a escola da Parada Inglesa desfilou.
Não existe perfeição no Carnaval. É uma máxima que, quem sabe do riscado, deve levar como mantra à avenida: ninguém entra na pista para tirar nota, é para perder nota. Afinal, o dez está garantido – cabe a cada setor manter ou minimizar ao máximo esta nota.
Esse festival de notas dez também culminou no quádruplo empate das primeiras colocadas. A incontestável campeã Tatuapé obteve os mesmos 270 pontos, com os descartes, da vice Mocidade Alegre, Mancha Verde e Tom Maior – a ordem só é definida com os critérios de desempate. Ainda assim, dizer que isso contribui para o espetáculo é uma falácia, e que todas as escolas deram um show e mereceram os 270 pontos é bom-mocismo.
O festival de notas dez não engrandece a festa: torna-a modorrenta. Desestimula a competição, afinal é aparentemente fácil obter a nota máxima. O pensamento de que “é só fazer o feijão com arroz” não deve permanecer em nenhuma agremiação. Se isto acontecer, teremos um carnaval (ainda mais) acomodado.
Além disso, os cinco primeiros lugares foram dominados por homenagens, seja a lugares, culturas ou artistas. Uma fórmula que, apesar de fáceis (e justas), tornam a competição um emaranhado de histórias conhecidas, ainda mais com tantas concentradas em um único ano: só de artistas foram quatro celebrados. No total foram dez tributos, incluindo lugares, estilos de vida e estilos musicais.
A homenagem é um caminho fácil, sobretudo se for de apelo popular. Nesse sentido, cabe à escola e aos criadores darem novos ares àquilo que muita gente já sabe ou conhece, não apenas nas formas e cores de fantasias e alegorias, mas em conceito, em traduzir e carnavalizar histórias reais sem apelar para clichês. Em São Paulo, infelizmente, os clichês são vários.
Ao colocar quatro grandes nomes de nossa música na pista, de uma tacada só, o Carnaval paulistano demonstra falta de tato e um tanto de falta esperteza das agremiações. Gastar tanto cartucho, com “balas” poderosas como Alcione, Gil, Fundo de Quintal e Martinho acabou por exercer o efeito contrário: ao invés de chamar os holofotes para aquele que almeja ser “o maior Carnaval do Brasil”, acabou por esvaziar a festa e tudo isso passar batido, sem o destaque que cada um dos celebrados merecem.
Não precisamos de temas malucos, talvez nem as pirotecnias muitas vezes vistas no Carnaval do Rio de Janeiro. A história brasileira e paulistana é cheia de enredos. Os patrocínios – hoje importantes e que dão parte da sustentação financeira às escolas – devem levar em consideração o valor cultural daquele enredo bancado. O Carnaval de São Paulo precisa de mais critério.
Pelos motivos expostos, nota 9,6.
Bruno Viterbo, jornalista do jornal SPNorte e um apaixonado pelo carnaval de São Paulo.
Texto replicado do site do jornal SPNorte.